Mischa sentou-se por um momento, coçou a cabeça, acomodou-se melhor no sofá, escondeu a cabeça entre os braços e começou a chorar.
Chorou alí sentado durante alguns minutos, permaneceu inerte durante outros...E então levantou-se.
Escovou os dentes, lavou o rosto e voltou a sentar-se no sofá.
Permaneceu novamente inerte por um quarto de hora. Inerte.
Em verdade permaneceu inerte por dois meses completos, quando se levantava, ia direto para seu quarto. De seu quarto saia apenas de manhã para ir à escola. Da escola ia, inertemente, para sua casa.
E assim permaneceu. Durante dois meses quase não falou palavra.
Quase ninguém notou. Sua mãe estava satisfeita, pois sempre o encontrava ocupado. Quando chegava em casa encontrava-o no quarto fazendo seus deveres escolares, quando ia dizer-lhe boa noite, este estava desenhando ou apenas lendo.
Seus professores encararam aquela mudança como disciplina, pois finalmente o aluno calara-se e passara a prestar a atenção na matéria.
Seus amigos, apenas, estranharam.
Roberto, uma noite perguntou-lhe se estava bem, Mischa apenas ignorou-o.
Marília uma vez se ofereceu para ouvi-lo, Mischa apenas disse que tinha fome.
Gabriel perguntou porque estava tão sumido, Mischa ignorou-o também.
Uma noite, sózinho em casa, resolveu-se..."Não comerei".
Mischa parou de comer.
Permaneceu sem mastigar por tres dias, e quando comeu, rejeitou metade.
Mischa estava, em verdade, profundamente deprimido, não se sentia mau, apenas deprimido.
Mischa não chorara dês de aquela vez em seu sofá.
Mischa se sentia bem, sentia que queria continuar daquele jeito.
Todas as suas ambições haviam sumido.
Aprender violino? Não mais.
Desenhar? Apenas rabiscar.
Tocar gaita, violão? Para que?!
Ler Ginsbourg e Kerouack? Não sentia mais vontade.
Fazer faculdade? Morreria antes.
Mischa encontrava-se agora envolvido por uma camada de autodespreso tão grande que já não sentia mais nada por sí mesmo.
Em seus pensamentos, não mais se enganava, Mischa era sincero. Se sentia mau, ridicularizava-se. Se sentia bem, torturava-se.
Nesse período Mischa passou a recorrer a autoflagelação. Sentia a dor física de forma tão intensa, que esquecia angustias recentes e antigas. Começou com apertar objetos metálicos sobre sua pele, apenas para que a pressão o distraísse. E em duas semanas passou a cortar-se.
Mischa encontrava na multilação uma certa distração que livros e musica não podiam lhe proporcionar. Estava bem daquele jeito.
Roberto, uma vez que preocupado com as profundas olheras, e os olhos vermelhos de Mischa o chamou para sair.
Dirigiram por alguns quilometros, ouviram musica auta. Mischa sorria, lapsos faciais mecanicos. Mas não dizia palavra alguma.
Roberto cada vez mais preocupado tentava distraí-lo, Mischa por sua vez se distraía sózinho, embora participando das brincadeiras do amigo, permanecia trancado em sua mente.
Por um mês inteiro, Roberto se preocupou em tira-lo daquela bolha, Mischa não queria sair. Roberto passou a sofrer junto com ele, mas sempre tentando anima-lo.
Roberto se preocupou a fundo com Mischa, por um mês inteiro deixou de viver, para tentar fazer com que Mischa vivesse.
Mischa havia morrido, ainda que momentaneamente, Mischa não estava mais lá. Os dois sabiam que uma hora Mischa voltaria.
Mischa, uma noite, voltou. Ainda que não discesse palavra, Mischa estava lá. Decidiu-se.
Acendeu um cigarro, da caixa que permanecera dois meses intocada. Do armário da cozinha, tirou algumas capsulas. Em seu quarto, ligou um disco e começou a engolir as drágeas.
Quando terminou de engolir sua porção de morte, podia apenas ouvir um coro distorcido que cantava.
"All is loneliness before me
All is loneliness before me
Loneliness comes botherin' round my house
Loneliness comes botherin'
Loneliness comes botherin'
Loneliness comes botherin' round my house
Loneliness
Loneliness comes worryin' round my door
Loneliness comes worryin'
Loneliness comes worryin'
Loneliness comes worryin' round my door
It was loneliness."
Louis Hardin
Roberto nunca existira, Mischa esteve sempre la, mas Roberto não. Era apenas uma sombra que Mischa desejava...Ele não estava lá.
segunda-feira, 22 de março de 2010
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2 comentários:
NÃO!
talvez.
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